Primeira semana de COP30 em Belém reúne recorde de participantes e cria debates sob clima amazônico intenso
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A primeira semana da COP30, realizada em Belém entre 10 e 21 de novembro de 2025, consolidou-se como um marco na diplomacia ambiental contemporânea. Instalado no coração da Amazônia, o encontro reuniu mais de 56 mil participantes e trouxe à tona debates complexos — desde o impasse das negociações internacionais até a urgência científica, passando por anúncios financeiros de grande porte e iniciativas inéditas de políticas públicas brasileiras.

Mais do que uma conferência climática, a COP30 expôs, de forma quase pedagógica, o contraste entre as expectativas globais e as limitações políticas que ainda impedem que as metas do Acordo de Paris ganhem tração real.
A dimensão histórica da COP30: entre a Amazônia e o mundo

A contagem oficial de 56.118 delegados registrados colocou a COP30 como a segunda maior da história — um dado que merece leitura cuidadosa.
Conferências climáticas costumam ser termômetros da disposição política internacional. Quanto maior a participação, maior a pressão sobre os negociadores. A presença significativa de governos, ONGs, grandes fundos internacionais, representantes do setor privado e, especialmente, de povos indígenas, produziu uma conferência plural, intensa e marcada pela disputa de narrativas.
Em Belém, essa diversidade se tornou ainda mais visível pela distribuição geográfica dos espaços da COP — pavilhão da sociedade civil, pavilhão dos povos indígenas, pavilhões nacionais, áreas técnicas e áreas de negociação formal.
Cada grupo carregava expectativas distintas:
Governos defendiam suas metas e buscavam recursos.
Empresas tentavam demonstrar avanços na transição energética.
Organizações ambientais cobravam compromissos vinculantes.
Indígenas e comunidades tradicionais buscavam reconhecimento, segurança territorial e protagonismo.
Acadêmicos pressionavam para que decisões refletissem evidências científicas.
O resultado foi um cenário vibrante e, ao mesmo tempo, tenso — típico de conferências em que os interesses estratégicos divergem sobre quem deve pagar a conta da crise climática.
O clima amazônico como protagonista: o corpo sente o que o planeta enfrenta
Realizar a COP no coração da Amazônia foi uma decisão estratégica — e, na primeira semana, ficou claro o quanto o ambiente influenciaria a percepção dos presentes.
Belém apresentou sua climatologia clássica de novembro:
Manhãs com calor intenso, sensação térmica acima de 38 °C e umidade acima de 80%.
Tardes com chuvas intensas, raios e trovões que chegaram a interromper painéis.
Ventos fortes ao entardecer, acompanhados do cheiro característico da floresta molhada.
Para delegados de países temperados, esse contraste — calor úmido e tempestades súbitas — reforçou a ideia de que a Amazônia não é apenas objeto de discussão, mas um ecossistema vivo e poderoso, capaz de influenciar diretamente as percepções climáticas do evento.
Clima político: urgência, cobrança e pouca margem de negociação
A sensação predominante nos corredores era de que o mundo está atrasado. O último relatório do IPCC já havia alertado para a necessidade de reduzir emissões globais em cerca de 43% até 2030. Estamos a cinco anos desse prazo, e nenhum grande emissor está alinhado a essa trajetória.
Por isso, mesmo antes da chegada dos ministros e chefes de Estado, a primeira semana registrou:
Pressão crescente sobre países desenvolvidos, cobrados a ampliar financiamento climático.
Frustração entre países em desenvolvimento, que alegam falta de recursos para acelerar a transição energética.
Críticas de cientistas, que classificam as metas atuais como insuficientes.
Choques diplomáticos, especialmente envolvendo exploração de petróleo, compensações financeiras e uso de créditos de carbono.
Belém, assim, tornou-se palco de disputas intensas — algumas discretas, outras explícitas.
Bilhões para florestas: o avanço do TFFF e o tabuleiro financeiro global
Um dos anúncios mais significativos da primeira semana foi o fortalecimento do Tropical Forests Forever Facility (TFFF). O fundo, concebido para recompensar países que conservam suas florestas tropicais, ganhou volume e relevância internacional.
Noruega, Brasil e o redesenho dos incentivos globais
A Noruega anunciou um compromisso de cerca de US$ 3 bilhões ao fundo.
O Brasil informou já ter aportado cerca de US$ 1 bilhão.
Esse fundo, que pretende chegar a US$ 125 bilhões, difere de iniciativas anteriores por funcionar como um endowment global, cujo rendimento anual seria destinado ao pagamento de países que evitam o desmatamento. A lógica inverte um modelo histórico: Em vez de punir quem desmata, o fundo premia quem conserva — conectando conservação territorial a estabilidade financeira.
Baku to Belém Roadmap: a promessa do US$ 1,3 trilhão anual

Outro anúncio de grande impacto foi o plano global para mobilizar US$ 1,3 trilhão por ano em financiamento climático até 2035.
Essa cifra busca corrigir uma lacuna histórica: apesar de as metas climáticas serem ambiciosas, os mecanismos de financiamento são insuficientes.
O Roadmap propõe:
aumentar a participação de bancos multilaterais;
criar linhas de crédito específicas para países vulneráveis;
ampliar garantias financeiras para atrair capital privado;
estabelecer regras mais transparentes para rastreabilidade;
incentivar investimentos em florestas e energia limpa.
Ainda não há consenso sobre governança, mas o plano foi considerado o passo mais concreto para tentar aproximar ambição e orçamento.
Discussões essenciais: energia, Paris e cidades
a) Transição energética: o dilema entre potencial e contradição
A “industrialização verde” ganhou destaque na primeira semana, impulsionada pela Belém Declaration, assinada por 35 países e organizações.
O Brasil tenta se posicionar como líder de uma nova economia que concilie:
expansão de renováveis (solar, eólica, biomassa);
hidrogênio verde;
captura e armazenamento de carbono;
bioeconomia da floresta;
biocombustíveis avançados.
Contudo, há contradições. O país ainda avalia a exploração de petróleo na margem equatorial, o que gera críticas de organizações socioambientais e tensão diplomática com parceiros europeus.
b) O Acordo de Paris em xeque
A COP30 ocorre após o primeiro ciclo completo do Global Stocktake, mecanismo que avalia se os países estão no caminho correto para limitar o aquecimento global a 1,5 °C ou 2 °C.
A resposta é clara: não estão.
Belém, portanto, tornou-se espaço de cobrança para que os países revisem suas metas nacionais (NDCs). A pressão recai especialmente sobre:
EUA
União Europeia
China
Índia
países exportadores de petróleo
O Brasil, embora tenha recebido elogios pela queda do desmatamento recente, enfrenta pressões por maior clareza em sua estratégia energética.
c) PlaNAU: um plano urbano histórico para o Brasil
O lançamento do Plano Nacional de Arborização Urbana (PlaNAU) foi um dos destaques da delegação brasileira. O plano estabelece:
aumentar a cobertura arbórea urbana;
garantir que 65% dos brasileiros vivam em ruas com pelo menos três árvores;
criar 360 mil hectares de áreas verdes urbanas.
Impactos diretos do plano
redução de ilhas de calor;
melhora da qualidade do ar;
aumento da resiliência climática;
valorização imobiliária;
redução do estresse térmico em grandes cidades.
Ao apresentar o programa em Belém, o governo buscou vincular a política interna a uma agenda climática global — gesto político que repercutiu positivamente entre países latino-americanos e organismos internacionais.
O “mapa” do US$ 1,3 trilhão: o grande legado em disputa
A ambição da COP30 está concentrada na construção de um roteiro estruturado para mobilizar US$ 1,3 trilhão anuais até 2035.
Se aprovado, será o maior plano de financiamento climático já pactuado.
Esse mapa está sendo disputado ponto a ponto:
Quem paga?
Como paga?
Com qual taxa de juros?
Com quais garantias?
Com qual rastreabilidade?
Qual fatia vai para florestas?
Qual fatia vai para mitigação e adaptação?
Como evitar corrupção?
Como proteger povos indígenas?
Nenhuma dessas respostas está fechada, mas as conversas avançaram mais rápido do que em conferências anteriores — justamente pela pressão internacional para resultados tangíveis.
Belém como símbolo, teste e oportunidade
A primeira semana da COP30 revelou um encontro grandioso em escala e densidade política. A Amazônia, com seu clima intenso e atmosfera simbólica, deu à conferência um caráter quase sensorial.
Do ponto de vista diplomático, o evento se mostrou dividido entre esperança e frustração:
Esperança, pelos anúncios bilionários, pelos avanços em fundos florestais e pelo debate mais transparente sobre financiamento global.
Frustração, porque muitos temas estruturais — como eliminação progressiva de combustíveis fósseis — permanecem travados por pressões políticas e interesses econômicos.
Para o Brasil, o saldo inicial é positivo: o país reforçou sua imagem de liderança ambiental, apresentou políticas novas como o PlaNAU e ganhou espaço no debate sobre financiamento para florestas.
Mas a segunda semana será o verdadeiro teste. Com a chegada dos chefes de Estado e dos ministros de Finanças, Belém pode:
entrar para a história como a COP da virada, caso o mapa de US$ 1,3 trilhão avance; ou
repetir o ciclo de discursos ambiciosos e resultados tímidos.
A expectativa, nos corredores e nos pavilhões, é de que a Amazônia — símbolo global da conservação e eixo estratégico do clima — inspire decisões capazes de responder à urgência do momento.
Referências
AGÊNCIA BRASIL. Governo lança Plano Nacional de Arborização Urbana durante a COP30. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br. Acesso em: 17 nov. 2025.
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THE GUARDIAN. Brazil’s offshore oil plans raise concerns despite climate leadership stance. Disponível em: https://www.theguardian.com. Acesso em: 17 nov. 2025.
THE WASHINGTON POST. Countries face challenges implementing energy transition despite political commitments. Disponível em: https://www.washingtonpost.com. Acesso em: 17 nov. 2025.



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